"No início do mês de Maio, voltei a Iúna. Voltar à cidade natal nunca é só uma viagem no espaço — é também uma travessia no tempo. Fui para presidir a Santa Missa na festa da Comunidade Matriz, Nossa Senhora Mãe dos Homens. A mesma Igreja onde fui batizado, onde comunguei pela primeira vez, recebi a Crisma e, mais tarde, fui ordenado padre. 

Presidir a missa naquele Altar é como folhear as páginas vivas da própria história. Cada canto daquele templo guarda um pedaço de mim: o menino que se ajoelhava curioso, o adolescente cheio de perguntas, o jovem em discernimento, o padre recém-ordenado com o coração palpitando de entrega. Estar ali de novo é um reencontro com todas essas versões de mim mesmo. 

Mas não foi só o templo de pedras e madeira que me recebeu — foi o templo de gente. Primos, primas, afilhados, antigos colegas de escola, companheiros de grupo de jovens… até minhas professoras. Algumas delas do tempo do antigo primário, quando o mundo era um quadro-negro e a vida cabia entre o recreio e a chamada. 

Foi ali, entre abraços e sorrisos, que reencontrei dona Ormy Noya de Oliveira Bastos. Aos 92 anos, firme como sempre, doce como só ela sabe ser. Foi minha professora da 4ª série — quando ainda se dizia assim, "4ª série". Aquela que corrigia cadernos com letra vermelha, mas coração manso. Que ensinava mais com o olhar do que com a voz. Encontrá-la foi como esbarrar de repente na própria infância. O abraço dela teve cheiro de caderno novo e som de campainha de recreio. 

Tiramos uma foto. Rimos. Falamos pouco, mas dissemos tudo. A vida, às vezes, só precisa de um gesto simples para dizer que está em paz. E o coração, quando volta para casa, não bate igual. Ele muda de ritmo. Vibra mais lento, mais fundo — como quem reencontra seu próprio compasso."

Pe. José Carlos Ferreira da Silva: Vigário Episcopal para Comunicação da Diocese de Cachoeiro de Itapemirim, Pároco da Paróquia Nosso Senhor dos Passos, bairro Independência, Cachoeiro de Itapemirim, Mestre em Ciências da Religião, Jornalista e Psicólogo.